Wednesday, March 30, 2011

BOLSONARO E SEU NICHO DE MERCADO REAÇA

Jair Bolsonaro é o típico reaça. Ué, você não sabia que essa espécie existia? Infelizmente existe, e tá longe de ser uma espécie em extinção. É a extrema direita em ação. Gente que apoia o Golpe de 64 (e nem chama de golpe, mas de Revolução, com letra maiúscula – até meados dos anos 80, quando eu estava na escola, ainda se chamava o golpe de revolução), que acha que tudo naquela época era melhor (o que é até estranho, no caso do nobre deputado, já que ele tinha apenas oito anos quando os militares tomaram o poder), que até hoje considera Médici, responsável pelos anos mais repressores da ditadura, o melhor presidente que o Brasil já teve, e que lamenta que os guerrilheiros que se opuseram ao regime ainda estejam vivos (pô, tem uma até no Palácio do Planalto!). Todas as visões que você puder imaginar vão na mesma linha TFP (Tradição, Família e Propriedade). Essa gente é coerente. É a favor da pena de morte, contra a legalização do aborto, contra as cotas raciais (eles não creem que existe racismo no Brasil; aliás, só acreditam num tipo de preconceito – contra o homem branco hétero!), a favor de um modelo de masculinidade na base do “prendo e arrebento, e de um modelo de femininidade que parou nos anos 50 (mulher nasceu pra ser dona de casa, cuidar dos filhos, e obedecer o marido). Odeiam feministas (não é à toa que Bolsonaro, junto com Charlie Sheen, é o maior ídolo dos machistas). Sua maior luta no momento é contra os gays, que eles chamam de gayzistas ou gaystapo. Obviamente são contra o casamento gay, contra a adoção de crianças por gays, contra qualquer tentativa de criminalizar a homofobia ou de ensinar as crianças a serem tolerantes com as diferenças. Pra eles, homossexualidade é doença e/ou desvio de caráter.
Como eu escolho minhas amizades, convivo pouco com gente assim, que segue tão à risca o modelito reaça. O mais próximo que conheço é um ex-militar, pai de amigos de infância meus, do tipo que traumatiza os filhos na base da porrada (ou palmadinha pedagógica, pros que gostam de eufemismos), e que, assim que o menino completa 15 anos, o leva pra um prostíbulo pra perder a virgindade. Putz, tá cheio de reaça assim na internet. Os que me conhecem me odeiam, porque discordamos em exatamente 100% de qualquer assunto possível e imaginável. Somos opostos extremos.
Desconhecer que essa gente existe, ou que se resume ao deputado, me parece um pouco de ingenuidade. Por isso também me soa estranho assombrar-se com as declarações que Bolsonaro deu na segunda no programa da Band, o CQC (que nunca vi; não suporto os tiques do Marcelo Tas, e uma câmera que copia seus tiques parece um pesadelo pra mim. Você pode ver o vídeo aqui). O deputado pelo PP (partido do Maluf, entre outras figurinhas carimbadas) respondeu a perguntas gravadas. Entre elas, o que ele faria se apanhasse o filho fumando unzinho (encheria de porrada, e, se tortura é agir com energia, então sim, ele torturaria), o que faria se o filho fosse gay (pra ele não há a menor chance disso acontecer, já que é um pai presente que deu aos fihos uma boa educação), se no exército há muita “viadagem” (ele respondeu que são poucos os gays, mas os que “aparecem” são tratados como se deve – o que, vindo dele, não deve ser boa coisa). A resposta mais polêmica ficou pro final, quando Preta Gil quis saber o que ele faria se o filho se apaixonasse por uma negra. Bolsonaro respondeu com aquela educação que lhe é peculiar (a mesma com que se orgulha de educar os filhos): “Preta, não vou discutir promiscuidade com quem quer que seja. Não corro esse risco, meus filhos foram muito bem educados e não viveram em ambiente como lamentavelmente é o teu”.
Eu acho que o escrotossauro pensou que ainda estava falando sobre a hipótese do filho ser gay, porque faz parte da cartilha da direita associar gays com promiscuidade (e pedofilia). Não que Bolsonaro não seja racista. Geralmente, a pessoa acolhe um pacote completo de preconceitos, e quem discrimina uma minoria costuma discriminar todas. Mas racismo é crime inafiançável no Brasil, e não creio que ele responderia de forma tão abertamente racista se tivesse entendido a pergunta.
A filha de Gilberto Gil disse que vai processá-lo, e é possível que ele seja levado ao Conselho de Ética da Câmara para se explicar. Ele conta com essa desfaçatez chamada imunidade parlamentar. Sinceramente, não acho que vai acontecer alguma coisa com ele, que já está no sexto mandato. Esse tipo de polêmica faz com que ele ganhe votos entre seu eleitorado fiel, não que os perca. Ele atende a um nicho de mercado que pensa igualzinho a ele e tem ódio do “politicamente correto” (porque, pra eles, ser politicamente incorreto é poder dizer todos os preconceitos que sempre falaram, sem serem contestados. Esse nicho não é pequeno. Dê uma olhada nos comentários do Terra, se tiver estômago). Por isso acho até graça um repórter perguntar pro Bolso se sua pregação anti-gay não poderia lhe tirar votos. Santa ingenuidade, Batman! É essa postura que lhe dá votos! Ou alguém vota no Bolso pelos seus lindos olhos azuis?
Mas sabe, vivemos numa democracia. Por mais que eu gostaria que nojentinhos com esse pensamento tenebroso sumissem da face da Terra, eles têm o direito de existir, de se manifestar, e de sentirem-se representados no Congresso.
Quanto ao programa televisivo, ele não está interessado em discutir coisa alguma. Só em audiência. E conseguiu. Pro CQC, pro Ratinho (ainda existe?), pra praticamente qualquer transmissão na TV, é o Ibope que mede o sucesso ou fracasso de um programa. Pra eles não convém contestar preconceitos, mas usá-los como chamariz. Marcelo Tas e equipe devem estar felizes da vida com tamanha repercussão.
Não adianta querer censurar Bolsonaro ou culpar o sistema político brasileiro (como se nos outros países não existissem políticos reaças!). O que se deve fazer é combater esse tipo de pensamento. É bom que tanta gente esteja indignada com as declarações do deputado. Que essas pessoas entendam que ele está longe de ser o único. Talvez, quando esse pensamento se tornar socialmente inaceitável, políticos como Bolsonaro deixem de ser eleitos. Mas pessoas que pensam desse jeito reaça sempre vão existir, em todo lugar. O que espero é que elas se tornem tão pouquinhas que não consigam ter força nem pra eleger o síndico do prédio onde moram sós.

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