Finalmente vi a versão americana de Os Homens que Não Amavam as Mulheres, e devo dizer que goste
i mais do que da versão sueca. É estranho, eu sei. Afinal, só faz sentido comercial (americano se nega a ler legenda) refilmar uma produção de apenas dois anos atrás. E é bem ridículo ver atores que têm inglês como língua materna falando inglês com um leve sotaque sueco, só porque decidiram que a refilmagem ainda se passaria na Suécia. Por outro lado, não daria pra história se passar em outro lugar, né? Por mais sedutora que fosse a ide
ia de mostrar um poderoso culto secreto devotado à misoginia no sul dos EUA, por exemplo, toda a série Millenium foi escrita por Stieg Larsson justamente pra mostrar que a misoginia corre solta até num dos países com maior igualdade de gênero no mundo, caso da Suécia.
Embora ache que Daniel Craig como o jornalista esteja bem melhor que o ator sueco Michael Nyqvist (pelo menos dá pra acreditar que todas as mulheres da trama iriam pra cama com o Daniel sem piscar), não creio que Rooney Mara seja uma Lisbeth mais ma
rcante que a de Noomi Rapace. As duas estão incríveis, e bem diferentes uma da outra. Quer dizer, pra falar a verdade eu me lembro muito pouco do filme sueco. O que fica na memória mesmo é a cena do estupro. Aliás, as cenas, porque são duas (ou três, ou duas e meia, se a gente considerar a parte em que o sujeito desprezível força Lisbeth a fazer sexo oral nele), e ambas repulsivas. Não sei quanto a você, mas não consegui torcer ou sentir que as mulheres foram vingadas quando Lisbeth estupra seu estuprador. Bem distante da sensação que sentimos em Ensaio sobre a
Cegueira, quando a mulher do cego mata o líder dos vilões estupradores com uma tesoura. Aí a gente vibra mesmo.
Bom, mas então por que acho a versão americana superior à sueca? Por causa do ritmo. O filme de David Fincher me prendeu, ao menos até chegar ao seu terço final. Creio que esse é o grande erro das duas versões: tem finais demais, não acabam nunca. É revirav
olta depois de reviravolta, e isso cansa. Não sei dizer em que parte exatamente a versão americana perde a mão, mas eu chutaria que é quando Lisbeth vai fazer pesquisa na biblioteca. De lá pra frente, o filme desanda, e, na minha opinião (óbvio que é a minha opinião! Não seria a opinião do padeiro, nem do meu gatinho), não se recupera mais. E, desculpe, mas a história não parece tão instigante assim pra me dar vontade de encontrar tempo pra ler a trilogia.
Antes de continuar, preciso dizer que, agora que vi a versão americana, discordo do texto da Rejectionist, que traduzi e publiquei. Lisbeth é uma personagem muito forte, sim. E muito capaz. Adoro
quando o jornalista pergunta se ela não vai anotar toda a tonelada de informações que ele lhe passa, e ela sugere que já está tudo guardadinho em sua cachola. Até concordo que personagens femininas “estranhas” (no caso, cheia de piercings e tatuagens) são sempre magras, porque ainda assim ficam dentro do padrão de beleza e podem ser sexualizadas por espectadores/leitores, enquanto se elas fossem gordas, estariam transgredindo demais as regras. Mas definitivamente não consigo v
er Lisbeth sendo criada para excitar homens, que é o que Rejectionist implica (se bem que aquele primeiro poster do Daniel abraçando uma Mara com os seios à mostra, hmm...). Lisbeth vive num mundo hostil, em que volta e meia é atacada por homens, mas sabe se defender e não parece depender deles pra muita coisa. Pra mim, ela é uma personagem muito feminista. E o filme, por condenar a misoginia, e por passar a visão e os valores de Lisbeth, é também muito feminista.
Ainda assim, cabem críticas. Uma marca de roupa lançou uma coleção de moda baseada na Lisbeth da versão americana. Isso fez com que Eva Gabrielsson, viúva de Larsson, se pronunciasse contr
a o merchandising. Pra ela, explorar a imagem de Lisbeth para vender produtos vai contra o que desejava o autor da trilogia. Eva, sueca como Larsson, viveu trinta anos (sem casar) com o escritor. Quando ele morreu, jovem, oito anos atrás, não deixou testamento. Os direitos do livro não ficaram com Eva, e sim com o pai e o irmão de Larsson, o que me parece profundamente injusto. Numa entrevista, Eva criticou Mara Rooney, que
disse numa declaração à imprensa que Lisbeth não é feminista, e que não se vê como parte de um grupo. Eva não gostou: “[Rooney] não sabe em que filme está? Ela leu os livros?” Para Eva, ainda que Lisbeth não se encaixe em nenhuma categoria, “Todo o seu ser representa uma resistência ativa contra os mecanismos que impedem que as mulheres avancem no mundo e, em casos piores, que sejam abusadas como ela foi”.
Eva já se manifestou contrária à tradução do título do primeiro livro (em sueco, “Homens que Odeiam Mulheres”) para “A Garota com a Tatuagem de Dragão”, que é como o filme se chama nos EUA. Segundo ela, esse título foge da temática dos livros e “parece título de livro infantil”. Bom, só se for livro infantil sueco. Mas go
stei de suas declarações. Pelo menos aqui no Brasil o título “Os Homens que Não Amavam as Mulheres” se manteve mais próximo do original sueco. Se bem que vai uma distância entre “não amar” e “odiar”, certo? Misoginia não é não amar mulheres. É odiá-las, inclusive odiar que possamos ser e fazer tudo que queremos (que vai além das nossas “missões” sexuais e maternais). Vou achar ótimo se Lisbeth Salander inspirar meninas a serem fortes e independentes. E se ela inspirar homens que nos odeiam a nos temer.





Bom, mas então por que acho a versão americana superior à sueca? Por causa do ritmo. O filme de David Fincher me prendeu, ao menos até chegar ao seu terço final. Creio que esse é o grande erro das duas versões: tem finais demais, não acabam nunca. É revirav







Eva já se manifestou contrária à tradução do título do primeiro livro (em sueco, “Homens que Odeiam Mulheres”) para “A Garota com a Tatuagem de Dragão”, que é como o filme se chama nos EUA. Segundo ela, esse título foge da temática dos livros e “parece título de livro infantil”. Bom, só se for livro infantil sueco. Mas go

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