Paris não podia pedir um cartão postal tão sedutor quanto o 41o filme de Woody Alle
n, Meia Noite em Paris. Não são só as ruas limpinhas, largas, belas, cheias de monumentos, arborizadas, feitas pras pessoas andarem. É a noção de que em cada esquina da cidade a gente vai esbarrar em algum marco histórico. Dá pra entender por que todos os artistas e inteletuais viviam em Paris na Era do Jazz, assim como é compreensível que o personagem do Owen Wilson, um roteirista de Hollywood e aspirante a romancista, queira ficar lá pra sempre. Ele não quer só ficar em Paris por toda a eternidade ― ele quer é permanecer naquela Paris dos anos 1920 com sua nova gangue de amigos, entre eles F. Scott Fitzgerald, Zelda, Hemingway (melhorou muito a imagem que eu tinha dele! Quero um Ernest assim), Gertrude Stein (Kathy Bates, ideal), Salvador Dali (Adrien Brody, muito engraçado), Buñuel (deu vontade de rever o grande O Anjo Exterminador), Man Ray, T. S. Eliot, Cole Porter (todo mundo con
hece a versão que o Chico canta com a Elza Soares, né?), e uma moça divina que já fora amante de Modigliani e agora é de Picasso, Adriana (interpretada por Marion Cottilard, que parece mesmo teletransportada de décadas passadas pra cá). Meia Noite é mais gostoso pra quem já ouviu falar nesses nomes famosos, mas creio que pode ser bem aproveitado até por quem pensa que Man Ray é marca de óculos escuros (vai dizer que não parece?).
Meia Noite deve ser o filme do Woody que tá recebendo a acolhida mais calorosa (de público e crítica) desde Ponto Final, e é uma gracinha. Tem um clima de nostalgia que le
mbra A Rosa Púrpura do Cairo. Praticamente todo os protagonistas da obra do Woody (tirando o de Ponto Final, que é talvez o que faça esse suspense tão diferente) são o Woody, o próprio ou imitadores. Não se pode esperar que um ator fraquinho como o Owen Wilson faça algo original. Mas ele é o Woody mais convincente dos últimos anos. Owen funciona bem porque seu personagem parece estar tão deslumbrado em compartilhar a sala com as figuras históricas dos anos 20 quanto o ator parece esta
r em atuar num filme do Woody. Já Rachel McAdams destoa e se sai mal num papel um pouco antipático e não desenvolvido (fica claro que Woody, apesar de ser milionário há décadas, não se identifica com os ricos de direita dos EUA). E nem reconheci o Michael Sheen como o intelectual chatinho disposto a corrigir a guia em Versalhes. Reconheci a Carla Bruni como a guia mas não achei nada de mais.
Além de divertido, Meia Noite traz algumas
questões interessantes: por que preferimos uma outra época que não seja a nossa? E, se pudessémos viajar no tempo, em que década gostaríamos de viver? Não sei se eu gostaria de voltar atrás. Por mais que eu e a torcida do Flamengo tenhamos fascínio pela Idade Média, duvido que alguém realmente gostaria de viver naquelas condições. O pessoal da minha geração fala com saudosismo do final dos anos 1960: revolução sexual, protestos mil, mudanças sociais e, no Brasil, a luta pra derrubar a ditadura militar.
Parece um propósito nobre viver nesse período, se não lembrarmos que toda a resistência à ditadura foi esmagada, torturada, morta, exilada, presa. Prefiro viver numa democracia do que numa ditadura, lutando pra retornar à democracia. Até porque tenho outras lutas. Fico com pena de quem acha que não há mais por que se lutar hoje em dia.
A gente quase sempre vai achar que uma outra é
poca foi mais interessante do que a que vivemos. Não estou falando do hábito da gente dizer que a década de tal era melhor que a de hoje, que é uma ideia nostálgica ― pensamos que filmes e músicas e costumes da década da nossa adolescência eram mais legais, mas isso só significa que sentimos saudades da nossa juventude. Enfim, não é isso. É voltar bem mais atrás mesmo. Pro personagem do Owen Wilson, a melhor década é a dos anos 1920. Pra Marion, que vive na década de 20, é a Belle Époque, na virada do século 1
9 pro 20. Mas o pessoal que vivia em Paris naqueles tempos não tinha ideia de que seu tempo seria tão especial a ponto de receber a alcunha de Belle Époque. E taí outro problema: a gente não tem como saber como nossa época será vista depois. Quando eu vivia minha adolescência nos anos 80, nem imaginava que aqueles tempos seriam apelidados de década perdida. Pra mim não pareceu perdida!
É fascinante também como a gente tem o costume de exagerar a beleza do passado (um passado em que a expectativa de vida era muito menor), mas não tem a mesma condescendência com o futuro. Geralmente pintamos o futuro mais como distopia, um pesadelo de ficção científica, do que como utopia. Por mais avançada que seja a ciência daqui a cem anos, por mais que as pessoas que fazem as cidades tenham se tocado e descoberto que vale m
ais a pena investir em transporte público que individual, por mais que a miséria diminua (vamos ser otimistas), o futuro sempre terá um enorme defeito, impossível de ser corrigido: não estaremos lá. E isso me parece muito injusto. Eu adoraria viver mil anos. Juro que se eu fosse um vampiro imortal você nunca me pegaria reclamando.
Foi um presente ver Meia Noite logo depois d
e conhecer essa cidade realmente mágica. Na vida real, ninguém conta que chove tanto em Paris quanto em Londres. São pelo menos 250 dias de chuva por ano entre os 365. Mas na comédia romântica do Woody temos dois personagens que acham que Paris fica ainda mais encantadora molhada. Isso sim é amor.


Meia Noite deve ser o filme do Woody que tá recebendo a acolhida mais calorosa (de público e crítica) desde Ponto Final, e é uma gracinha. Tem um clima de nostalgia que le


Além de divertido, Meia Noite traz algumas


A gente quase sempre vai achar que uma outra é



É fascinante também como a gente tem o costume de exagerar a beleza do passado (um passado em que a expectativa de vida era muito menor), mas não tem a mesma condescendência com o futuro. Geralmente pintamos o futuro mais como distopia, um pesadelo de ficção científica, do que como utopia. Por mais avançada que seja a ciência daqui a cem anos, por mais que as pessoas que fazem as cidades tenham se tocado e descoberto que vale m

Foi um presente ver Meia Noite logo depois d

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