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ADIVINHA QUEM A PARADA GAY SP VAI HOMENAGEAR
Fiquei incrédula anteontem de manhã, ao saber que a Parada Gay de SP (que será realizada amanhã) decidira homenagear o Marcelo Tas. Não gosto muito de criticar moviment
os do qual não faço parte (embora eu me considere muito simpatizante dos LGBTTT), pois sempre parto do princípio que cada grupo sabe muito melhor do que quem está de fora quem quer homenagear ou contra o que lutar. Mas é chato quando se vê que uma minoria, ou parte dela, não se antena com o que está acontecendo com as outras.
Por exemplo, Tas faz parte do CQC, um programa preconceituoso (inclusive homofóbico) que recentemente ofendeu inúmeras mulheres ao ridicularizar as mães que amamentam em público. A repercussão não foi pequena: houve vários mamaços por todo o país.
Além disso, Tas é colega de Rafinha Bastos, que vem sendo um dos principais alvos das Marchas das Vadias pela sua asquerosa piada sobre estupro (aliás, assine a petição para que ele se retrate). Comentei no Twitter que achava a escolha da Parada uma bola fora, e perguntei se, na organização, não havia nenhuma lésbica, que poderia estar a par das asneiras machistas que o CQC vem cometendo (e não custa lembrar: homofobia e machismo andam sempre de mãos dadas).
Seguiu-se um diálogo fascinante com um montão de gente que estava tão indignada com essa homenagem quanto eu. A @aiaiai63 disse que isso era provavelmente um serviço de marketing pessoal (assessoria de imprensa) do humorista/jornalista/apresentador para tentar melhorar um pouco sua imagem e, assim, brecar a fuga dos patrocinadores do programa. E, acrescentou ela, a própria declaração de Tas de que sua filha era lésbica já tinha sido estratégica.
Pois é. Tas só tirou sua filha do armário para milhões de espectadores depois das declarações homofóbicas de Bolsonaro no CQC (o Will corrigiu que Tas já havia falado da filha antes, no ano passado). Convenhamos: aquela entrevista com Bolso fez mais mal do que bem. O pessoal esclarecido, mais à esquerda, pró-direitos humanos, já sabia que o deputado era um reaça de marca maior. Mas uma parte do eleitorado conservador não conhecia a figura, e adorou conhecê-la.
Foi só depois da entrevista no CQC que apareceram absurdos como “Bolsonaro pra presidente” (tomara
que ele concorra: divide a direita e não ganha nunca; seria um Le Pen brazuca). Claro, é louvável que Tas tenha declarado ter orgulho da filha lésbica, mas não deixa de parecer oportunista. Por que só naquele momento, e por que só quando surgiu uma onda gigantesca contra os gays alavancada pelo programa que ele comanda?
Dois dos meus interlocutores mais ligados foram @gramppo, que explicou que vários gays e lésbicas ligaram pro CQC na ocasião da cobertura do protesto na Ofner (houve um beijaço lá; o
CQC foi desrespeitoso), e @MkGerald, que lamentou que um homem como Tas, que já se manifestou contra o PL 122, seja homenageado por uma parada que planeja conseguir 1,5 milhão de assinaturas a favor do projeto. Ele também comparou a homenagem indigna com uma dada a Luciana Gimenez, que foi vaiada durante a Parada, porque no seu programa havia humilhado duas lésbicas.
O Jonas lançou um desafio pra ele próprio: disse que em pouquíssimo tempo faria uma lista de gente mais merecedora de homenagens pelo movimento LGBTTT do que Tas. Reproduzo o email que Jonas me mandou:
Oi Lola! Quando soube por você a notícia que o Marcelo Tas seria homenageado na Parada Gay de São Paulo, meu primeiro pensamento foi “Mas o quê?”. Assim que te disse que faria uma lista de gente bem melhor para ser homenageada na Parada, me vieram à mente inúmeras pessoas: artistas, ativistas, jornalistas, blogueiro
s, que mesmo talvez não sendo tão famosos quanto o Tas (alguns bem underground), com certeza merecem homenagem e visibilidade. Já que pessoas mais engajadas (e menos hipócritas) que o Tas existem aos montes, tive que filtrar bastante os nomes para uma lista de seis que considero importantes, pelo menos pra mim: Deborah Duprat: Procuradora Geral da República, a primeira mulher a ocupar o cargo. Com alguns dias como Procuradora, ainda em 2009, foi ao STF pedir o reconhecimento da união estável entre homossexuais. Duprat também é a favor do aborto e foi uma das principais defensoras da Marcha da Maconha neste ano. Deborah tem sido uma das principais figuras públicas a lutar a favor dos Direitos Humanos nesses últimos anos.
Jean Wyllys: O ex-BBB, deputado pelo PSOL, tem se mostrado um dos maiores políticos brasileiros engajados na luta contra qualquer tipo de preconceito, principalmente contra a homofobia. É ele que, ao contrário de muitos outros, não tem cedido, tem batido de frente com a bancada evangélica, além de fazer parte do partido mais “gay-friendly” do Brasil. Qualquer pesquisa no Google sobre o mandato do Jean me enche de
orgulho e até me faz esquecer que ele já fez parte do Big Brother. Marta Suplicy: Uma mulher forte, Marta tem décadas de história na luta feminista e LGBT, e é com certeza um dos nomes mais influentes e admirados pelos gays. Mesmo com algumas controvérsias, foi ela que propôs a união civil homossexual, isso há mais de 15 anos, e foi ela que desarquivou o PLC122 este ano. Não sei se ela já foi homenageada na Parada, não sou de SP, mas com certeza deveria, mesmo que fosse de novo, ainda mais nesse ano de avanço conservador.Iara Bernardi: Professora, filiada histórica do PT e relatora do PLC122. Mostrar apoio a ela seria muito mais lógico que homenagear o Tas, afinal, é na Parada que querem colher mais de 1 milhão de assinaturas de apoio ao Projeto, não é?
Tiago Santiago: Tá, podem me xingar se quiserem, porém, mesmo Amor e Revolução não sendo exatamente a novela que esperávamos (em relação à direção e atuação, por exemplo), a histór
ia vale muito a pena. Além de ter personagens femininas fortes, a novela também foi a primeira a exibir um beijo gay (e entre mulheres, o que ajuda muito na visibilidade lésbica). A homossexualidade está sendo bem abordada, diferente do que acontece na Globo.Plínio de Arruda Sampaio: Mesmo não tendo votado nele (o que meio que me arrependi depois da suspensão do Kit Anti-Homofobia pela Dilma), Plínio foi o único candidato à presidência que apoiou abertamente o casamento gay e foi o único também a assinar um termo de compromisso à causa LGBT. Longe de mim querer fazer a Parada Gay um movimento partidário, mas se alguém tem coerência no seu discurso, esse alguém merece meu respeito.
Bem Lola, essa foi minha listinha, que apesar de modesta, inclui nomes muito melhores que o Tas. É claro que há muito mais gente (Ivan Valente, Maurício Costa, Paulo Búfalo, Dr. Rosinha, entre outros), não conseguiria falar de todos aqui, nem teria muito tempo pra explicar o motivo, mas eu disse pra você que seria fácil, não seria?
Verdade. E anteontem no Twitter ninguém se lembrou da primeira pessoa que me veio à mente: Toninho Cerezo. Não, o ex-jogador de futebol não é gay, nem é militante pelos direitos LGBTTT, mas pelo menos ele não faz parte um programa de TV preconceituoso.
E, se o que determina uma homenagem numa das maiores paradas gays do mundo é uma demonstração de amor de um pai que aceita e se orgulha d@ filh@, que tal esta carta de Toninho, pai da modelo transexual Lea T, publicada na revista Lola? É de uma delicadeza ímpar, olha só:“Qual pai um dia não pensou desta maneira? Como seria bom se existisse um manual com
pleto, que ensinasse e orientasse como ser pai em todas as etapas da vida dos filhos!Por mais que existam livros, manuais, conselhos bem-intencionados, a grande verdade é que exercer a paternidade vai muito além de conselhos e teorias. Todos sabem que cabe à paternidade uma parcela da responsabilidade de cuidar, educar, proteger e preparar os filhos para o ingresso na sociedade. Mas a alma humana é muito complexa, e estamos bem longe de saber tudo o que esse ser mutante chamado Homem é capaz de fazer, querer e ser…Meu menino, minha menina pra sempre, eternamente, os dois serão meus.Ainda no ventre, Leandro foi um filho esperado e amado. Na sua infância, seu sorriso doce e os cabelos cacheados não me indicavam qualquer tendência, era apenas uma criança, era apenas meu filho. Com o passar dos anos e a chegada da adolescência, conheci, na intimidade e nos momentos que passamos juntos, seu jeito
diferente — a clara ausência de predileção por brincadeiras masculinas. Percebi interesse por assuntos ligados à arte e ao universo feminino.Por conta da minha formação familiar ter sido baseada em respeito, cresci em um ambiente livre e pude escolher jogar futebol e viver apenas com meus dons no campo. Como não tive o tão sonhado manual, 'Como Criar Filhos', criei os meus igualmente livres também para suas escolhas, sem cobranças nem imposições. Apesar de notar as diferenças, percebi também que nada poderia fazer, e tudo o que poderia dar a ela/ele era o meu amor incondicional, a segurança, o conforto e a certeza de que, em qualquer circunstância, por mais que longe, eu estaria sempre ao seu lado.Em alguma entrevista, Lea disse que a única coisa que gostaria de ter aprendido no futebol eram as embaixadinhas (veja só!), e que até tentou aprender, mas não foi muito bem-sucedida. Sei que trabalho em um ambiente teoricamente machista, mas nunca houve influência nem espaço para cobranças, apenas dei oportunidade de estar comigo caso quisesse.Pode ser que eu tenha sido negligente como pai, mas não há motivos para frustrações. Não p
odemos ser bons em tudo. E você, Lea T. Cerezo, sabe muito mais que embaixadinhas. Teve coragem de, elegantemente, tentar quebrar paradigmas e mostrar ao mundo que devemos aceitar, sim, as diferenças, ser tolerantes com a diversidade, entender e não julgar aquilo que não conhecemos.O caminho pode ser longo, mas com certeza não será o mesmo depois de você. A paternidade é livre de qualquer padrão, de qualquer critério imposto pela sociedade, filho deve ser aceito na sua totalidade, na sua integral condição de vida, independentemente de sua orientação sexual.Como diria o poeta Cazuza, 'O tempo não para, não para, não, não para', e filho crescido não cabe mais aos pais educar. Sendo assim, aqui ou lá, torço por você, Lea. Menino ou menina, Leandro ou Lea, não importa mais, sempre serei seu pai e você, orgulhosamente, um pedaço de mim.”
Desejo todo sucesso do mundo à Parada Gay que ocorrerá amanhã, mas torço que ela seja mais política, escolhendo nomes que realmente façam jus a uma homenagem, e menos midiática. Sem perder a alegria e a ternura jamais.
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