Friday, December 2, 2011

CRÍTICA: SAGA CREPÚSCULO – AMANHECER, PARTE 1 / Bella é enganada

- Aposto como a Lolinha vai contar spoilers e estragar meu apetite!

Gostei dos três primeiros filmes da série Crepúsculo porque os achei muito sexy. Claro que os livros da mórmon Stephenie Meyer são propaganda da abstinência sexual (não os li, não tenho muita vontade, mas, acima de tudo, não tenho tempo). Só que os filmes tinham uma energia sexual latente e nada sutil. Bella queria transar com Edward. E também com Jacob. E claro que sou team Jacob all the way (todo mundo sabe o que é esse negócio de team Jacob, team Edward, ou, como disse uma leitora, team Bella being hit by a van? É a torcida por um ou outro). Jacob, além de ter sangue quente e ser muito mais bonito que Edward (e que Bella, vamos ser honest@s), parece ser mais equilibrado. Certo, há um forte espectro de violência doméstica rondando sua espécie lobística. E esse negócio de imprinting (não pergunte) é coisa de stalker, né? A verdade é que, sem a energia sexual, a história não vai muito longe. É o que acontece com Amanhecer, o quarto e pior exemplar da série.
Assim como tenho certeza que os filmes são bem menos conservadores que os livros, estou certa que os produtores da franquia sabem o que falam sobre ela. E existem umas falas nos filmes que dialogam com essas críticas, e que duvido que estejam nos livros (corrijam-se se eu estiver errada). Por exemplo, na véspera do casamento, Edward quer revelar a Bella um segredo terrível. E ela, sorrindo: “O quê, você não é virgem?” Mas não, o segredo é sobre seus primórdios vampirísticos, quando ele matava gente pra tomar seu sangue. Um flashback mostra Edward num cinema, muitas décadas atrás, e uma espectadora se levanta. E o meu alerta feminista já piscou: “Putz, ele era um serial killer de mulheres?! Só faltava essa!” Mas há um twist, e Ed no fundo mata um cara que iria matar a mulher que foi mostrada. Portanto, acho que há uma preocupação em tentar fazer de Edward alguém menos doentio. Porque, de fato, ele apresenta muitos sintomas de uma personalidade perigosa: é um stalker (quem persegue o alvo de sua obsessão), é obcecado por Bella, tem dificuldade pra se controlar quando está sexualmente excitado (ou no mínimo esta ameaça sempre é trazida à tona)... Pelo menos nos filmes ele não parece ser muito ciumento –- não se incomoda em “permitir” (sei que o verbo é ridículo) que Bella seja muito amiga e fique a sós com Jacob, que é quase um ex e seu rival em potencial. Neste quarto filme ele está muito mais sensível, no bom sentido, e seu comportamento está mais pra conservador que pra violento.
Ah sim, Amanhecer é de particular interesse pra gente porque algumas cenas foram filmadas no Rio. Essa parte carioca, embora curtíssima, respeitou bastante o Brasil. Nada de macaquinhos andando em cipós na floresta amazônica, ou de mulheres rebolando seminuas, como é de praxe. É só um cenário para Bella e Edward se divertirem antes de chegar à ilha (que não entendi onde fica). Mostra um montão de gente alegre, bebendo e dançando, e o mais incrível, gente de todas as cores, idades, formatos e classes sociais. Já tô até prevendo uma parcela da nossa classe média reclamando que o filme não representou bem o Brasil...
Tirando isso, o filme (a série, aliás) é a maior propaganda enganosa. Afinal, toda a explicação para Edward não transar com Bella é que ele, vampirão, muito mais forte, iria se descontrolar durante o sexo e matá-la. Por isso, com ele, só casando. Mas o negócio é que ele iria transformá-la em vampira e, como parece que os vampiros são tão monogâmicos quanto os pombos e os católicos, eles iriam viver pra sempre, transando sempre, sempre jovens, e com o mesmo nível de força. Era só por isso que eles não fizeram sexo antes, certo? Tá. Então Bella, no dia do seu casamento, conta a Jacob que ela e Edward terão sua primeira noite como vampiro e humana, e só depois ela será transformada em vampira. Hã? Pra isso não precisava ter casado com dezoito anos, menina! Jacob fica compreensivelmente irritado com a estupidez do casal.
Não vemos a noite de núpcias. Mas não somos poupados de todas as babaquices tradicionais que Edward, por ser uma espécime do século retrasado, ainda comete –- receber Bella do pai no altar, carregá-la pra dentro da casa, chamá-la de Senhora Sobrenome do Marido (ele é de outro século; qual é a sua desculpa pra continuar com esses ritos patriarcais?). Por isso que o início do filme é tão irritante, e tão antiquado como o modelo que a maior parte da sociedade ainda insiste em seguir. Vemos Bella aprendendo a se tornar mais feminina. Sua futura cunhada ou sei lá o quê exige que ela tenha um senso fashion adequado, e que ela chegue ao altar com sapatos de salto altíssimo que ela nunca usou. E ela é a única que não discursa no seu casamento! (é assim nos casamentos em geral, o noivo discursa, a noiva não? Tô por fora). Quem reclamava que Bella era passiva nas três primeiras partes da série ainda não viu nada.
A metade inicial de Amanhecer trata do aprendizado de Bella pra ser ainda mais submissa, que é como uma mulher (mórmon, imagino) deve ser. Aí chegamos à noite de núpcias, com Bella devidamente treinada. E vemos que Edward de fato perde o controle, porque ele arrebenta a cama de madeira. Mas aí, gente, primeira decepção: Bella não morre. Tá, tô sendo injusta. Diferentemente da minha leitora que é team Bella being hit by a van, eu não quero Bella morta. Mas a história toda não era que, se eles transassem sem que ela fosse vampira, ele iria acabar com ela? Então por que no dia seguinte ela acorda toda feliz e saltitante (Scarlett O'Hara feelings após ser estuprada por Rhett Butler), e só muito depois percebe que tem várias marcas pelo corpo? (Tenho certeza que tudo isso foi atenuado no filme, e que no livro a tortura a que ela se submete é muito mais gráfica). Recapitulando: Bella casa só pra virar vampira e poder transar com Edward; eles transam -– coisa que só vinham adiando porque ele é super conservador e jurava que iria matá-la sem querer se ela não fosse também vampira --, e ela sobrevive numa boa com alguns machucadinhos. Pô, eu me senti totalmente enganada. Mas, como disse o maridão: “Se você se sentiu enganada, imagine ela”.
Pouco depois, no entanto, descobrimos qual o único propósito de Edward fazer sexo com uma Bella ainda humana. É que, ao contrário dos pombos e dos católicos, os vampiros não se reproduzem. Não geram filhos. E essa noção de um casal sem filhos pelo jeito não cai bem pra definição de família que mórmons e demais religiosos conservadores têm (outro dia ouvi que eu e o maridão não constituimos uma família, porque não temos filhos). Então um milagre acontece e Bella engravida. Mas como?!, pergunta-se todo mundo no universo de Crepúsculo, menos Bella, que acha tudo aquilo lindo e natural. E começa a surgir um vampirinho em seu ventre, sugando-lhe toda a energia vital.
Nessa parte Amanhecer fica muito mais interessante, até porque vem acompanhado de toda uma discussão sobre aborto (sem que esse palavrão, aborto, seja pronunciado uma única vez). Assim que Edward fica sabendo da gravidez, ele diz pra Bella não se preocupar, que eles tirarão isso da sua barriga. “Isso?”, balbucia ela, horrorizada. Todo mundo é a favor do aborto, menos ela e uma outra cunhada sua, uma chata que corrige sempre que alguém trata o embrião monstrinho de feto (é baby, diz ela). Jacob vai até lá convencer Bella a abortar, porque ela não vai sobreviver ao parto. “Vou sim”, afirma Bella. “Eu sou forte”. Essa também é a única parte do filme em que ela sai de sua habitual passividade. Pena que é pelos motivos errados, porque ninguém acha que ter aquele filho é uma boa ideia. Primeiro porque ela vai morrer se o tiver. Ok, até aí, tinham falado isso pra ela sobre fazer sexo, e mentiram descaradamente. Mas, no caso da gravidez, ela já está morrendo. Quantos quilos a Kristen Stewart perdeu pra fazer aquelas cenas? Porque desde O Bebê de Rosemary (em que uma mulher magérrima contra todos também tá grávida de um feto não-humano) a gente não vê uma gestante tão frágil. Em Amanhecer a gravidez é pintada como algo abominável, que faz sofrer e pode matar -– mas fazer o quê, se é isso que as mulheres querem? Dá uma discussão fascinante. Se sou a favor da mulher poder fazer o que quiser com seu corpo, devo ser a favor que ela persista numa gravidez de altíssimo risco, se é isso que ela deseja.
O problema é que o risco é altíssimo não só pra Bella, mas pra toda a humanidade. O feto já está se alimentando avidamente de sangue humano. Sabe-se lá do que vai se alimentar, e em qual quantidade, quando nascer e crescer. A irmandade dos lobos decide que aquela aberração não pode nascer. E aí todos os Cullens, que até então eram a favor do aborto, passam a viver pra defender Bella e seu feto, perdão, bebê. Felizmente, por não ser uma gestação normal, ele nasce rapidinho.
E mais não vou contar, porque é desnecessário, previsível, e porque a parte final vem aí. E, é claro, porque todo mundo sabe como a saga termina, menos eu. Mas a boa notícia é que Edward parece que, com a paternidade, finalmente vira um vampiro melhor. A má é que Bella finalmente morre. Quer dizer, quase.

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