Tuesday, July 19, 2011

GUEST POST: O MOTIVO DO UNIFORME DA BABÁ SER BRANCO

Clube paulistano de elite proíbe a entrada de babá sem uniforme branco

No post A Mais Bela Empregada Doméstica, a Jaqueline deixou um comentário tão bom que várias leitoras pediram para que fosse transformado num guest post. Portanto, ei-lo.

No ano passado passei por uma experiência no mínimo interessante. Como pretendo viajar como au pair (babá com algumas regalias no exterior), cuidei de uma criança da elite brasileira, dessas que a família tem lavadeira, cozinheira, arrumadeira, babás e folguistas, motorista, segurança particular. A cozinheira e eu dormíamos na casa e uma noite o nosso ventilador quebrou. Dormíamos em um quarto extremamente pequeno (uma dormia na cama e a outra em um colchão no chão) e que já era muito quente, porque lavávamos nossas roupas à noite e como não podíamos estendê-las tínhamos de secá-las imediatamente, e todos sabem que o quarto de empregada nada mais é do que uma extensão da área de serviço; a secadora ficava a exatamente dois passos da nosso quarto. Bom, não bastasse todo o conforto do qual desfrutávamos, naquela noite de um verão de 40 graus, confirmamos a famosa frase de que "tudo pode piorar". Depois de trabalharmos aproximadamente 14 horas, tivemos de dormir naquele inferno. E sabe no que pensávamos? Caramba, já é mais de meia noite e não conseguimos dormir, como a gente vai aguentar o dia todo amanhã? Depois de muito rolar em nossa sauna particular, tive uma idéia, molhei uma toalha e a coloquei sobre mim, e finalmente consegui dormir. No outro dia a nossa patroa disse-nos: ah, o patrão até ia comprar um ventilador, mas como ele estava muito cansado, achei melhor que ele fosse hoje. Ele até poderia estar cansado, mas como eles tinham o ar-condicionado em sua suite, pensaram, Ah! nem tá tão calor assim vai, até amanhã ninguém morre de calor e a área de serviço tem uma brisa muito agradável! Acho que não preciso escrever mais nada. Só sei que nunca vou esquecer o sentimento de ser tratada como um utensílio da área de serviço que poderia esperar até o outro dia para ser consertado.
Faço bicos de babá há 9 anos, desde meus 15. Já passei por várias famílias, várias mães, cada uma com seu jeito de cuidar dos filhos, bom, cada uma com sua teoria de como cuidar dos filhos, e nós obrigadas a aprender e a seguir essas teorias com as crianças que cuidamos. Tornamo-nos uma extensão da criança; geralmente dá para saber o que fizemos durante o dia dando uma olhada em nossos uniformes, marca de pézinhos, hoje elas brincaram no parquinho, umas manchas roxas, hoje a pequena quis o suco de uva, alguns riscos de caneta, quantas vezes já disse para babá não deixá-la brincar com objetos pontiagudos. Acho que é por isso que nosso uniforme é branco: ele poupa que as mães percam seu tempo perguntando-nos como foi o nosso dia. Digamos que somos um briefing escrito pelas próprias crianças.
Já assistiram ao filme Diários de uma Babá? A primeira vez que o vi chorei, ri, fiquei com raiva da patroa. Esse filme é uma adaptação do livro Diários de Nanny, de Emma Mclaughlin e Nicola Kraus. Se eu tivesse escrito um diário durante esses anos, muitas das situações do livro e do filme estariam nele. Apesar de passar o tempo todo preocupada com os possíveis tombos e machucados, prestando atenção a cada gole de água, a cada pedaço de comida que esses pequenos seres colocam nas suas bocas, no fim de cada período com as crianças o que fica na minha cabeça é o sorriso delas. Na experiência que eu comentei anteriormente, apesar de tudo o que passei, do que mais me lembro são das situações que ríamos, das brincadeiras, dela sentada na cozinha brincando de fazer pedido, enquanto eu pedia nosso almoço. Para mim a situação mais difícil era o último dia. No outro dia eu não ia ver aquela carinha de quem acabou de acordar, não ia aconchegá-la na hora do Lazy Town (desenho que ela gostava, mas tinha medo).
Ser babá é exercer a função de mãe, sem ter filhos; é ser psicóloga, nas intermináveis conversas "do que pode e não pode";
é ser pedagoga, quando brincamos de escolinha e de quebra ensinamos as letras e os números; é ser até mesmo chef de cozinha, quando fazemos um quitute que os pimpolhos gostam; é ser palhaça, só para ouvir aquela risada gostosa; é ser mágica, quando conseguimos protegê-los do medo segurando naquelas mãozinhas que são do tamanho de nosso dedo. Para aquelas que cuidam das crianças como gostariam que seus filhos fossem cuidados, babá é isso.Tem mãe que diz que só elas podem falar mal dos filhos. Bom, com a gente também é assim, a criança pode estar no maior ataque, mas se alguém fala um A, a gente já sai em defesa dos nossos picorruchos. No fim, falei mais da minha relação com as crianças, porque a relação com as mães não muda muito, continua valendo o "manda quem pode, obedece quem tem juízo" (infelizmente).

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