Wednesday, April 20, 2011

“ACORDA, HUMANIDADEEE!” - Entrevista com o ator baiano Bertrand Duarte





Bertrand Duarte. Arquivo pessoal. Foto: Célia Aguiar

O premiado ator, produtor e publicitário baiano Bertrand Duarte, como artista multifacetado que é, fala das suas experiências no cinema brasileiro/chileno, das incursões pela TV e também da  pretensão de retornar ao teatro. Nessa conversa descontraída e inteligente, Bertrand também relembra a sua célebre atuação no filme SuperOutro (1989, Edgard Navarro). Com esta entrevista o blog operáriadasruínas conclui a trilogia em homenagem aos 22 anos de SuperOutro.

Operária das Ruínas – Bertrand, a sua atuação em SuperOutro rendeu o prêmio de melhor ator no Festival de Gramado, em 2009. O que representa esse trabalho para a sua carreira?

Bertrand Duarte - Representa o corte do cordão umbilical. A expansão da minha referência para outros estados, principalmente, para São Paulo, onde conheci Emílio de Biasi (que me levou para a Rede Globo) e o grande cineasta Carlos Reinchebach, que logo depois de Gramado me presenteou como protagonista de uma das obras mais importantes de sua carreira – segundo a crítica e imprensa especializadas em seus filmes - que foi Alma Corsária (1996). Este belo filme de Carlão nos rendeu os prêmios de melhor ator no Festival de Cuiabá, melhor filme em Brasília e no Festival de Pésaro, na Itália.




Cartaz de SuperOutro (Edgard Navarro, 1989)



Cartaz de Alma Corsaria (Carlos Reinchebach, 1996)

  






Operária das Ruínas – “Eu tô ficando com a cabeça podre”, diz o personagem a certa altura do filme. Afinal, quem é SuperOutro?

BD - SuperOutro é a luta contra o NÃO sistemático e irreversível. É nadar contra a corrente. É acreditar que se pode voar sem asas ou com as asas cortadas. Quem vê o filme passa a entender isso de forma clara, lúcida.

Operária das Ruínas – Ler revista “pornográfica” recitando Castro Alves ou Gregório de Matos, masturbar-se e gozar vendo o programa televisivo Rolentrando. O que você pode destacar do processo de composição desse complexo personagem?





Cena de SuperOutro (Edgard Navarro, 1989)
BD - O SuperOutro é um homem comum sofrendo de esquizofrenia, desesperado com a perda de referências e cada vez mais empurrado para o precipício das misérias social e econômica. Quem me ajudou a construí-lo foi Fernando Bélens. Fizemos uma preparação sistemática in door bastante rica de informações (pois Fernando é também médico psiquiatra) e depois partimos para as ruas com a finalidade de me ambientar no principal espaço/cenário do filme, que são vários pontos turísticos da cidade de Salvador. Foi sensacional porque a partir daí eu pude ignorar quem me olhava ou me achava estranho. Nenhum louco se preocupa com sua aparência ou com o que está vestindo, não é verdade? Isso foi fundamental para incorporá-lo e baixar a fé cênica. Tenho muito orgulho quando dizem pra mim, como por exemplo, o que me falou recentemente a diretora Gabriela Barreto, que é fã do filme: “Nunca vi uma interpretação tão verdadeira, tão visceral”. Não posso deixar de citar a sinergia que existiu e que ainda tenho com Edgard Navarro. Nossa ligação no set é muito produtiva e a criação brota entre o que ele deseja e o que eu consigo materializar na interpretação. É muito forte mesmo. Em O homem que não dormia (filme que tem estréia marcada para julho deste ano) creio que repetimos a dose.

Operária das Ruínas – Durante as gravações das cenas de rua você se recorda de algum fato inusitado ou curioso? Como a população  local reagia às provocações daí advindas?




Bertrand Duarte e Edgard Navarro durante as filmagens do Superoutro. Foto: Élcio Carriço

BD - Creio que se fosse nos dias atuais, com a paranóia ainda mais evidente em relação à violência de psicopatas e de marginais, teríamos que ter redobrado a nossa preocupação quanto às reações de populares e da polícia. As pessoas se assustavam comigo quando eu chegava sozinho nas locações. Fiz isso sistematicamente enquanto não estava filmando, para não virar um personagem carnavalizado ou caricato e pra não perder a tensão de cada cena. Claro que tive a proteção de Bélens e de algumas pessoas que sempre ficavam por perto. Em algumas cenas a câmera ficava escondida, exatamente para utilizar os transeuntes na sua naturalidade e reação totais.


Operária das Ruínas – Diante da condição marginal do personagem, o que representa sua a missão ou o seu dever  (voar)?

BD - Creio que essa frase “O meu dever é voar” arrebata o sentido da poesia ou da transgressão em quem a assiste. Um cinema cheio, ouvindo essa frase, naquele momento do filme, quando ele parte para realizar essa promessa insana, deixa o espectador invejando aquele ser tão convicto da liberdade que ele tem: voar! Também já percebi que as pessoas se deliciam com o patético que vai “se lenhar”, pois não vai voar coisa nenhuma e o grande espetáculo será vê-lo – quem sabe - espatifando-se na próxima cena.

Operária das Ruínas – Nessa distância de 22 anos do lançamento de SuperOutro, quais trabalhos você destaca na sua trajetória de ator?

BD - Alma Corsária, de Carlos Reinchebach; Memorial de Maria Moura (Rede Globo);  Uma mulher vestida de sol (Rede Globo); Pau Brasil, de Fernando Bélens; Dawson Isla 10, de Miguel Littín (Chile), que entra em cartaz no Brasil este ano.



O personagem Rivaldo Torres em Alma Corsária (1996). Foto: Alexandre
 



O personagem Nives em Pau Brasil (Fernando Bélens). Foto: Henrique Andrade


Operária das Ruínas – Fazer cinema na Bahia e no Brasil – ontem e hoje. Quais são os principais desafios?

BD - Hoje está mais fácil do que na época do Plano Collor, por conta do aprimoramento das leis de incentivo e também pela tecnologia, que possibilita fazer um filme em sistema digital, embora pra isso se exija também muita qualidade de realização. Portanto, fazer é mais fácil. O grande dilema do cinema brasileiro, que está fora do esquema das grandes distribuidoras e exibidoras, é a distribuição. Precisamos popularizar mais o cinema e fazer com que tenhamos mais canais de exibição, que não seja só a sala de convencional, mas ocupar as TVs a cabo e internet, por exemplo.

Operária das Ruínas – Quais planos povoam a cabeça do ator Bertrand Duarte neste momento?

BD - Estou em captação de um projeto para voltar ao teatro, e executando outro direcionado para rádio e cine/TV. Também numa torcida muito grande para a estréia de meu reencontro com Edgard Navarro em O homem que não dormia.



No set com o diretor Miguel Littín flimando Dawson isla 10. Foto: Álvaro Rivera
















Miguel Lawner em Dawson Isla 10. Foto: Álvaro Rivera













Conheça outros trabalhos de Bertrand Duarte:

CINEMA:


SUPEROUTRO (protagonista)

Média metragem roteirizado e dirigido por Edgard Navarro – 1988 – Salvador - BA

Prêmios de Melhor Ator, diretor e roteiro do Festival de Gramado 1989


ALMA CORSÁRIA (protagonista)
Longa metragem roteirizado e dirigido por Carlos Reinchebach – 1996 – São Paulo – SP

Melhora ator no Festival de Curitiba - 1998

Melhor Filme no Festival de Brasília – 1997

Melhor Filme no Festival Internacional de Pésaro – Itália


CHEQUE MATE
Curta metragem dirigido por Emanuel Requião – 2004 – Salvador – BA

FALSA LOURA (participação especial)
Longa metragem roteirizado e dirigido por Carlos Reinchebach – 2006 – São Paulo – SP

ESPETO
Curta metragem roteirizado e dirigido por Guilherme Marback – 2006 – São Paulo – SP

PAU BRASIL (protagonista
Longa metragem dirigido por Fernando Belens – 2007 – Salvador  – BA
Melhor Ator no Festival de Curitiba
Melhor Direção de Arte
Melhores atriz coadjuvante

MEIO POETA
Curta metragem dirigido por Caco Monteiro – 2007 – São Paulo – SP

DAWSON - ISLA 10 (INÉDITO)
Longa metragem de Miguel Littin – 2009- Chile / Brasil (ESTREIA NO BRASIL MARÇO 2010)
Indicado pelo Chile à academia de Hollywood para Oscar de Melhor Filme Estrangeiro 2009

O HOMEM QUE NÃO DORMIA (protagonista)
Longa metragem de Edgard Navarro – 2008 – Salvador – BA (INÉDITO)

ROMERO (protagonista)
Curta metragem projeto para minissérie TV. (INÉDITO)


TELEVISÃO:

“RENASCER”

Rede GLOBO - Novela dirigida por Luiz Fernando Carvalho – 1994

“MEMORIAL DE MARIA MOURA”

Rede GLOBO – Seriado dirigida por Luiz Fernando Carvalho – 1995

“UMA MULHER VESTIDA DE SOL”

Rede GLOBO – Especial dirigido por Luiz Fernando Carvalho – 1996

“O COMPADRE DE OGUM”

Rede GLOBO – Especial dirigido por Roberto Talma – 1998

“ANTÔNIA”
Rede GLOBO – Seriado dirigido por Tata Amaral – 2006

“AMAZÔNIA”
Rede GLOBO – Seriado de Glória Peres – 2007

“A FAVORITA”
Rede GLOBO – Novela de João Emanuel – 2008


TEATRO:

“ESTÓRIA DE LENÇOS E VENTOS” (INFANTIL)
de Ilo Krugli – Direção Antonia Adorno
Teatro Santo Antônio – Junho / 80

“O AMOR DO NÃO”

de Fauzi Arap – Direção Eduardo Cabús
Teatro Gamboa – Dezembro / 80 a fevereiro / 81
Prêmio Martim Gonçalves (Melhor Ator Coadjuvante de 1980)

“SABARÁ”

de Ana Maria Pedreira Franco – Direção Carlos Caetano
Teatro Vila Velha – Outubro / 81

“O REI DA VELA”

de Oswald de Andrade – Direção Walter Saixas
Teatro do ICBA – Setembro e outubro / 82
Indicado para o Prêmio Martim Gonçalves (Melhor Ator de 1982)

“15 ANOS DEPOIS”
de Bráulio Tavares – direção Arly Arnaud
Solar do Unhão – Janeiro / 83

“DECAMERÃO”

de Bocaccio – Adaptação Cleise Mendes – Direção Luiz Marfuz
Teatro Ipanema (Rio de Janeiro) – Abril e maio / 83

“OS MISTÉRIOS DO SEXO”

de Coelho Neto – Direção Manoel Lopes Pontes
Teatro Vila Velha – Agosto / 83

“A MORTA”

de Oswald de Andrade – direção Walter Seixas
Teatro do ICBA – Novembro e Dezembro / 83

“A SERPENTE”

de Nelson Rodrigues – direção Walter Seixas
Sala do Coro do Teatro Castro Alves – Maio / 84

“MARIA GOIABADA”

de Fernando Mello – Direção Álvaro Guimarães
Teatro Vila Velha – Outubro / 84

EM ALTO MAR

de Slawomir Mrozeck – direção Ewald Hackler
Teatro Santo Antonio – junho e julho / 85

“DEUS”

de Wood Allen – direção Edgard Navarro
Teatro Santo Antonio – junho e julho / 86

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