Thursday, January 26, 2012

GUEST POST: MACHISMO E APOLOGIA À TRAIÇÃO NUM COMERCIAL DE CERVEJA

Enganar a mulher é a maior diversão

O Robson, do blog Consciência, pediu para que este guest post fosse publicado rapidamente, antes que um comercial de cerveja ridículo (mais um!) saísse do ar. Assim como em outros guest posts (que são, para quem não sabe, posts escritos por outras pessoas, não por mim), não concordo com tudo que está escrito neste (vou deixar vocês adivinharem com o que não concordo, pra não influenciar ninguém). Mas concordo que o comercial seja machista.

Machismo, ridicularização do amor e apologia à traição conjugal são comuns em propagandas de cerveja. E não foi nada diferente no comercial em que a Skol divulga sua promoção, intitulada “Operação Skol Folia” (veja aqui o comercial).
Além de reduzir a frangalhos a beleza e a essência romântica da música de Aerosmith, "I Don’t Want to Miss a Thing", e do próprio filme Armageddon, ali parodiado, o comercial chama a atenção pelo seu caráter bastante machista e pró-traição: enquanto a mulher se abala ao saber que vai passar um tempo, talvez a vida toda, longe de seu amor por causa de uma suposta guerra e fica em casa pensando nele, zelando pela vida do amado e temendo sua morte (porque militarismo e guerra são sempre violência e morte, e sou ativamente contra a existência de forças militares), o “soldado” vai para o carnaval e a trai covardemente, sambando e flertando com mulheres “gostosas” e “aproveitando a vida” na farra em contraste com a vida de privação de sua namorada/noiva/esposa.
Ao fim da “guerra”, o comandante e um soldado vão à casa da mulher, que, ao gesto do comandante, se abala ao acreditar inicialmente que seu amado morreu, mas o soldado faz o gestinho de curtir carnaval. Nisso a expressão da mulher é covardemente omitida.
E o machismo da propaganda é triplo. Primeiro porque rebaixa as mulheres duas vezes, através de dois arquétipos: primeiro coloca a mulher como a dona-de-casa que não tem o direito de curtir a vida (ao contrário do seu cônjuge macho), e em seguida mostra-a como brinquedo sexual, como a “gostosa” sem sentimentos que diverte os homens ao ser bolinada. Segundo porque propagandeia aos homens heterossexuais a crença (ou valor cultural) de que é “bom demais” trair sua companheira, jogar fora anos de amor que ela lhe deu em troca de alguns dias de carnaval e usar outras mulheres como se elas fossem meros brinquedos feitos para bolinar ou fazer sexo.
Comerciais desse tipo, além de legitimar uma cultura de objetificação/submissão da mulher e banalização da traição conjugal, deixa aquel@s, mulheres ou homens, que realmente sabem o que é amar e ser amad@, ferventes de raiva, até por empatia à mulher que foi trocada pelo carnaval pelo marido. Aquelas mulheres que sabem o que é se despedir dos seus amados por causa de uma missão militar e sequer saber se voltarão a ver os rostos deles, incluindo muitas brasileiras cujos companheiros foram enviados ao Haiti ou ao Líbano, certamente estão ferventes de raiva desse comercial. Porque ele faz pouco caso do sentimento delas; trata seu amor como algo desprezível, muito menos importante do que poucos dias de folia.
Imagine-se então, mesmo não sendo algo realmente verossímil, o triplo golpe para a mulher: a) ser separada de seu amor, com ela temendo que seja para sempre; b) no final descobrir que foi enganada, já que seu companheiro não foi para nenhuma missão, mas sim para a folia traí-la; c) tomar conhecimento, estarrecida, que seu amor é um cafajeste que usa mulheres como meros objetos sexuais, incluindo ela própria.
Profana-se ali algo sagrado para milhões de seres humanos: o amor legítimo, o compromisso do coração, o pacto mútuo de fidelidade e proteção. Exalta-se como valor cultural o abandono da companheira pelos seus homens, mesmo que não haja qualquer pacto de relacionamento aberto -– e isso, em inúmeras culturas, incluindo a ocidental, é traição, é violação do pacto conjugal. É não só um acinte ao valor do pacto de fidelidade como parte do amor de relacionamentos não abertos, como é antiético, já que causa sofrimento intenso à mulher, frustração com a vida, descrença no amor, depressão, solidão.
E ainda impõe-se à mulher papéis extremamente desfavoráveis, como já foi dito, através desses dois arquétipos: o primeiro da dona-de-casa que não tem os mesmos direitos de diversão que o seu homem e deve aceitar que foi traída -– dada a omissão do sentimento, reduzido à total irrelevância, da mulher do comercial; o segundo da mulher-objeto “gostosa” que vai ao carnaval seminua para divertir sexualmente homens solteiros ou traidores.
Esta propaganda, ao meu ver, merece intervenção do CONAR (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária), portanto desde já convoco vocês leitor@s a denunciá-lo. Porque não basta todo o mal que o consumo irresponsável de bebidas alcoólicas faz para a sociedade, ainda temos que ver uma bebida alcoólica sendo promovida com triplo machismo, apologia à traição conjugal e desrespeito aos sentimentos, incluindo milhões de casais verdadeiramente apaixonados e tantas mulheres que temeram perder (ou mesmo perderam) seus amados homens em guerras ou “missões de paz”?
Modelo de mensagem a enviar para o CONAR: "A referida propaganda, para divulgar sua promoção de carnaval, investe no machismo, no incentivo à traição e no desrespeito ao sentimento das mulheres companheiras de militares em missão. O machismo aparece três vezes: [pode ser citado o que eu já disse no post]. Portanto, venho pedir providências em relação ao referido comercial".
Dados a serem colocados no formulário de reclamação: Veículo de comunicação: televisão. Emissora: Globo. Data: 17/01/2012. Hora: em torno das 13h (ou, se você assistiu à propaganda em outra emissora, data e/ou horário, coloque os seus próprios dados).

No comments:

Post a Comment

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...