Por: Ciro Brigham*
Brincadeira não tem hora. Aqui vai uma crônica escrita por um amigo (segundo ele, trata-se de singela homenagem....)
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"O Palhaço". Divulgação |
Meu nome é Daniela. Gostei daquele filme do Selton Melo e do Paulo José. O Palhaço. Estética anos 70 e tal. Deprê, muito bom. Eu... fui palhaço na adolescência. Sim, fui palhaço. Devo ter chorado na sessão exatamente por isso.
Eu queria dinheiro pra sair com meu primeiro namorado. Anos 80, Itabuna, Bahia. Ele nem era bonitinho, mas era meu primeiro namorado, sabe? Ter um dinheirinho e tal. Então, rolaram uns bicos de palhaço. Não de circo, mas desses que animam festinha. Eu nem era engraçada, pra começar... Mas tudo bem. Foi num desses aniversários de novo rico que o menino aniversariante me chamou de... palhaço da desgraça. Eu sofri.
Meu patrão era genial. Comprava pomada Minâncora pra pintar a nossa cara. Pãodurice mesmo. E nós, palhaços da desgraça, chorávamos porque a pomada ardia.
E aquele menino aniversariante... bem, o pai dele queria que eu, muito esquelética, palhaça moribunda de pomada Minâncora na cara, fosse filmada dançando lambada... Ó Deus. Eu não merecia e me recusei. Muito enfático, o menino gritou: dança, palhaço da desgraça!
A desgraça era ser um palhaço naquelas condições, ele tinha toda a razão. Artista descartável e maltrapilha, com a cara toda ardida e o nariz vermelho de plástico me asfixiando (tenho um narizinho natural considerável). E sem o dinheiro pra sair com o namoradinho, pois aquela revolta implicava em não receber o cachê. Era tanta poesia nessa cena que chorei.
Não me lembro qual a dor que mais doeu, se a da pomada ou a de ser o palhaço da desgraça. Não me lembro se a lágrima rolou até o bico do frouxo sapatão ou se, enlameada, estagnou-se atolada na magra maçã de meu rosto. Bem Almodóvar. Foi assim que larguei o único ofício para o qual eu sabia que tinha nascido. Belo filme esse do Selton. Todo palhaço tem ao menos uma graça. A minha é Daniela Galdino.
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