Tuesday, May 31, 2011

ATLETAS MULHERES E A IMPOSIÇÃO DO UNIFORME SEXY

Olha só a coincidência: no mesmo dia (sexta-feira) fiquei sabendo de duas medidas arbitrárias, imagino que comandadas por dirigentes esportivos homens (aliás, uma coisa que me chateia é como tem treinador, técnico, dirigente homem pra comandar equipes femininas em qualquer modalidade esportiva, enquanto a gente nunca vê uma técnica mulher numa equipe masculina). Ambas envolvem uniformes femininos usados nos esportes. A primeira foi esta: a Federação Mundial de Badminton agora está obrigando as jogadoras a vestir saia ou vestido durante as partidas, e não mais shorts, como a maior parte costuma usar. Os dirigentes admitiram que a medida visa atrair mais público (os comentários no artigo da Folha são, pra variar, os piores possíveis: além do racismo característico –- causado porque as duas fotos escolhidas na matéria são de atletas asiáticas -–, vem um bando de marmanjo dizer que atleta mulher tem que usar saia mesmo, “de preferência sem calcinha”). As atletas reclamaram, e tentarão recorrer da decisão unilateral (update: a medida foi anulada, mas voltará à pauta em dezembro, quando serão ouvidos "os interessados", que não são as jogadoras, mas os fabricantes de roupas esportivas!).
Ainda na sexta, o Daniel Neves, do UOL Esportes, me enviou um email perguntando o que eu achava sobre a federação europeia de basquete feminino exigir que todas as atletas da Euroliga adotassem um modelo de uniforme colado ao corpo. Sim, você adivinhou certo: a razão é pra chamar mais atenção pro campeonato (pelo menos eles nem disfarçam mais os motivos).
A verdade é que a sexualização dos uniformes femininos tem piorado bastante nos últimos tempos. Se analisarmos uniformes masculinos e femininos das Olimpíadas de 1984, por exemplo, veremos quepoucas diferenças entre o que homens e mulheres vestiam. Com o backlash, a reação conservadora que teve início nos anos 80, a situação mudou, e atletas mulheres tiveram que voltar a ser, antes de tudo, objetos sexuais. Escrevi um post há três anos falando de alguns uniformes ridículos para mulheres. É lógico que se o critério de adoção para os uniformes justos e diminutos usados por equipes femininas fosse a melhora do desempenho esportivo, os homens também os usariam. Só que não tem nada a ver com performance. Tem a ver com fazer as atletas mulheres se encaixarem num padrão palatável para o olhar masculino. Em outras palavras: é o olhar masculino que rege como atletas mulheres devem se comportar, o que vestir, como jogar, como posar para fotos de autopromoção...
Não sei se você lembra, mas no basquete feminino a seleção australiana era das poucas que utilizava o uniforme colado, aquele estilo macaquinho. As brasileiras o usaram durante 2000 e 2006, mas não gostaram e os dirigentes tiveram que voltar atrás.
Pra mim não resta dúvida: é um claro sinal de machismo que as atletas tenham de pagar este tipo de “pedágio” para poder competir. Pelo jeito, se elas não forem atraentes pros homens, elas não podem jogar. É revoltante que essas profissionais, que vivem para treinar e competir, tenham que se sujeitar a serem sensuais para atrair público. Não deveria ser a beleza ou a “femininidade” das atletas que está em questão, e sim seu talento para o esporte que praticam (e isso vale para todas as profissões).
Para os homens que não veem nada de mais em exigir que atletas usem roupas menores, mais justas, mais sexy, fica a pergunta: e se fosse com eles? Por exemplo, mulheres vão muito pouco a estádios de futebol. E se de repente, para atrair mais o público feminino, a FIFA obrigasse os jogadores a usar sunga? Seria justo?

PS: A matéria para a qual fui “entrevistada” foi publicada no UOL no sábado, e Daniel utilizou uma boa parte do que falei. Ficou boa. Só não gostei de um trecho do que disse um especialista em marketing esportivo, que é contra os uniformes colados porque “nem todas as jogadoras têm um corpo legal” e, assim, poderiam ficar envergonhadas em usá-los. Ahn, o que é um “corpo legal”? Ainda mais pruma atleta? Devemos lembrar que atletas, e pessoas em geral, vêm numa variedade grande de formatos.
Até agora há poucos (e melhores) comentários.

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