Thursday, May 5, 2011

GUEST POST: CAMISINHA É TÃO BANAL QUANTO ESCOVA DE DENTE

Lembram do penúltimo guest post, sobre uma leitora que engravidou duas vezes do mesmo namorado e fez dois abortos? A caixa de comentários foi um escândalo, com a maior parte condenando a moça. Bom, no mesmo dia uma leitora muito querida (que prefere se manter anônima) escreveu e me enviou um texto ótimo com algumas de suas reações. Ele é basicamente sobre como e por que ela ensina seu filho de três anos a se familiarizar com a camisinha. Taí o guest post, do qual só discordo da primeira linha.

Imagino que todos nós concordamos que a Lola escreve bem melhor do que nós, que somos, afinal, opinadores não especialistas nesta incrível arte da língua, mas, acho que o escrevalola, mais do que um blog de resenhas e textos, tornou-se uma plataforma de discussão e troca entre os leitores. Assim, a partir da polêmica dos guest-posts sobre o direito ao aborto, fiquei com vontade de compartilhar com vocês minha história.
Em primeiro lugar quero dizer que não sou a favor do aborto! Sou a favor do direito da mulher em optar por interromper uma gravidez, de acordo com as situações específicas da sua vida, o que é bem diferente de ser “a favor do aborto”. Mas não é para dar minha opinião sobre a função do Estado na regulação das decisões individuais sobre o próprio corpo que estou aqui.
O que eu quero mesmo é falar de outra coisa: de camisinha.
Infelizmente nossa cultura, ainda extremamente baseada em ideais românticos, nos impede de encarar nosso corpo com mais naturalidade e respeito e a camisinha ainda não tem o lugar que mereceria ter na vida de todas as pessoas sexualmente ativas ou potencialmente ativas.
Eu, como a maioria das mulheres, instruídas ou não, tive minha primeira relação sem o uso de preservativo, e continuei usando e não usando esporadicamente, de acordo com o grau de paixão que dava contorno ao meu envolvimento afetivo com o parceiro.
Até que me envolvi com um homem que, pela primeira vez, usava a camisinha com imensa naturalidade, e essa desenvoltura tornou-se uma grande revelação sobre minha própria sexualidade. Não tinha vacilo, estávamos sempre protegidos e isso tornava o encontro muito mais divertido, porque era sem medos; éramos responsáveis. Nossa relação durou pouco mais de um ano e se desfez naturalmente por alguma razão, da qual não me recordo.
Mesmo depois de casada (não, não foi com aquele “rei da manipulação de preservativos”), e, mesmo tendo fases em que tentei usar métodos anticoncepcionais hormonais, eu sempre me senti melhor usando a camisinha. Parece que com o preservativo eu sou DONA do meu corpo, dos meus desejos, sem contar a praticidade do negócio.
Eu e meu parceiro tivemos um filho, e depois dele continuamos a usar preservativo: hoje, quanto mais os anos passam, mais nossa vida sexual se enriquece e a camisinha é praticamente parte do fetiche e a bandeira da liberdade sexual entre nós (somos monogâmicos, há mais de uma década).
Então, acho que foi praticamente natural que um dia meu filho, de 3 anos, viu uma embalagem coloridinha e perguntou o que era, pediu para abrir. Desde esse dia ele diz que é o “Balão do Papai” e sempre pede para abrir uma para brincar. Ele enche de água, brinca como com qualquer outro objeto. Quando vou na farmácia, meu filho pede pra comprar balão do papai, escolhe pelas embalagens e volta faceiro pra casa com ela. Claro que sempre tem quem fique horrorizado em ver uma criança de 3 anos carregando um pacote de camisinha na mão, mas encaro com naturalidade.
Ele não demonstra ainda, como qualquer criança de sua idade, nenhuma curiosidade sobre “de onde vem os bebês”, nem nada parecido. Outro dia me perguntou pra que o papai brincava com aquele balão, e eu disse que era pra por no pinto. E ponto. Falei o tamanho da verdade suficiente, sem criar tabus, mas sem dizer o desnecessário. O que me interessa é que o uso deste objeto seja pro meu filho algo totalmente banal.
Eu conto isso porque acredito que o preservativo deva fazer parte da educação das crianças como um objeto sem tabu. Assim como as ensinamos a escovar os dentes, assim como elas sabem que existe o fio dental, assim como temos molho de pimenta na mesa, ainda que elas não comam. Simples assim. Porque eu quero que o meu filho saiba que o uso do preservativo é fundamental para uma vida saudável. Espero, assim, estar contribuindo para menos crianças não planejadas daqui a 15 anos.
Tenho certeza que se atitudes simples assim fossem tornadas políticas de saúde pública, poderíamos discutir o direito ao aborto sob outras premissas, que não a da religião, que não a da dominação de gênero.

No comments:

Post a Comment

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...